Os soldados voltavam da “grande” guerra.
Encontraram a aldeia tal como a deixaram, cem anos atrasada em relação aos
lugares que percorreram.
E à noite, no serão, enquanto o candeeiro
fumacento tremeluzia, os mais ousados observavam:
-
E dizer que temos uma grande nascente, bem no meio
da aldeia, que faz girar o moinho do André, e que com essa água seria tão fácil
produzir eletricidade!
Os sonhadores de planos, os fazedores de projetos,
os palradores repetiam:
-
E isso seria tão fácil!
-
Poderíamos iluminar-nos com tão pouca despesa!
-
A nossa aldeia ficaria tão transformada!
Os céticos, porém, sabendo o resultado daquelas
veleidades, concluíram:
-
Sempre vivemos com a nossa madeira resinosa e o
nosso candeeiro fumacento... Dizer e fazer são duas coisas diferentes...
Um dia, Mathieu pôs mãos à obra: fundou um
sindicato, mandou estudar um projeto, arranjou fundos. Não é preciso dizer que
as autoridades, a administração e a prefeitura puseram-se contra ele.
E os “inovadores” tão corajosos e os sonhadores de
planos divertiram-se a perturbar, com o seu ceticismo, a empresa temerária
daquele que pretendia transpor para a realidade os sonhos dos palradores.
Mas, certa noite, a eletricidade iluminou a
aldeia!... A luz se fez!... Em volta dos candeeiros espalhados ao longo das
ruas, a juventude dançou festejando o milagre finalmente realizado.
A luz tornara-se, então, uma coisa pública,
evidente e definitiva, e os “inovadores”, os sonhadores de planos e os
palradores elogiaram seus benefícios. Hábeis na arte de explorar o trabalho dos
outros, formaram um comitê, informaram os jornais e, na inauguração oficial,
convidaram aqueles mesmos que se haviam
oposto ao projeto audacioso, o prefeito à frente.
No entanto, esqueceram-se de Mathieu, que pegou a
enxada e foi para o campo, cuidar da futura colheita. Aliás, já tivera sua
recompensa, pois fizera jorrar a luz!
( fragmento do livro
“Pedagogia do bom senso”, de Célestin Freinet)
Esta história de Freinet retrata, ainda hoje, a
educação brasileira: temos muitos professores sonhadores, fazedores de projetos
e palradores que estão sempre planejando a escola ideal, descrevendo o aluno
desejado, discutindo as propostas adequadas e discursando sobre a importância
da educação.
Aí chegam os céticos da profissão e despejam um
balde de água fria dizendo que não vale a pena sonhar, planejar e discutir
porque nada vai mudar.
Com certeza as mudanças, a “reforma” na educação
não acontecerão apenas nos gabinetes, nos palanques e nos discursos dos mais
inflamados intelectuais. As mudanças acontecerão graças ao trabalho dos Mathieu
das escolas, daqueles que sonham, planejam, discutem e realizam o trabalho
pedagógico diariamente.
O professor pode estar insatisfeito com sua
profissão, com a falta de valorização e o desrespeito crescente mas, ao assumir
a tarefa de educar assume uma postura ética de compromisso com a verdade e aprendizagem. Assume o papel de inovar e
desenvolver conhecimento, tanto para si como para com seus alunos, respeitando
as possibilidades de cada um.
A estes professores, os Mathieu das escolas, que desejam e merecem a valorização e
reconhecimento, mas não esperam por ela para realizar seu trabalho queremos
parabenizar e encorajar. Parabenizar pela seriedade com que realizam seu
trabalho, não medindo esforços para todos os alunos desenvolvam aprendizagem. Encorajar
a continuar com um trabalho ético e responsável em suas salas de aula
construindo redes de energia para que seus alunos possam irradiar conhecimento
e construir pontes com novos saberes.
Parabéns
professores e professoras!
Janete Cristiane Petry - psicopedagoga do Espaço Dom Quixote
janetepp@espacodomquixote.com.br
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