O olhar aprisiona, encanta, mobiliza, invade, rejeita e apaixona. O olhar sinaliza a permissão e impõe a condição, ele determina caminhos e impede a invasão. O olhar transmite, comunica desejos e vontades, necessidades e medos.
Dizia o poeta que os olhos são a janela da alma. E quando não há olhar, não há alma? Seria o Outro que não olha um desalmado, sem vida e sem intenções?
Para alguns manter o olhar num objeto de desejo ou comunicar uma intenção necessita da permissão e do olhar correspondente. Quando não me olham não há porque eu olhar.
Em casa ou na escola, o papel de quem educa é garantir um olhar que valorize e acalente a criança, que dê um significado a tudo que ela faça.
Olhar nos olhos dos filhos ou alunos quando eles falam conosco, pedir o olhar deles quando estamos falando com eles, garantem a atenção e valorizam o momento, além de dizer: “Estou prestando atenção em você neste momento e valorizando o que você está me dizendo”.
Mas, há aquelas crianças cujo olhar não entendemos, que não fixam o olhar em nós e se perdem num mundo unicamente seu. Resgatar este olhar e dar um significado a ele é tarefa de todos que se dedicam a esta criança. Insistir nas brincadeiras, no toque, cantando e nomeando são estímulos necessários para buscar e entender o olhar de uma criança autista.
Acompanhamos o esforço de familiares e profissionais que se dedicam a estimular as crianças com espectro autista e a dedicação com que buscam desenvolver estratégias que envolvam as crianças e as façam interagir com os demais, trazendo sua atenção e olhar para a nossa realidade.
A cada resgate de olhar, por menor que seja, faz-se uma festa e surgem novas expectativas e mais estímulos são feitos.
Para quem não recebe o olhar de um filho, de uma criança, há um mundo diferente a desvendar. Um mundo onde o olhar tem outro significado, onde a realidade está em outra dimensão.
Um olhar fala de amor, de reciprocidade. Se não há olhar, não há amor e reciprocidade? Talvez precisemos entender o amor de outras formas para saber que podemos amar e ser amados, mesmo quando não entendemos o olhar de quem não nos olha como desejamos.
Talvez o poeta Fernando Pessoa entendesse desse tipo de amor e queira nos ensinar a amar de uma forma silenciosa, sem perguntas e respostas, sem exigências e necessidades a serem preenchidas.
O Amor
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar..
Janete Cristiane Petry - janetepp@espacodomquixote.com.br
Psicopedagoga do Espaço Dom Quixote
0 comentários:
Postar um comentário